Pais recorrem à justiça depois de cartório rejeitar nome africano de bebê

Foto: Arquivo pessoal

Um casal de Belo Horizonte está com dificuldades de registrar a filha recém-nascida. O bebê, que nasceu no dia 22 de setembro, ainda está sem certidão de nascimento porque o nome Tumi MBoup, escolhido pelos pais, não foi aceito pelo cartório.

Para a mãe da criança, a historiadora Kelly Cristina da Silva, e o pai, o sociólogo Fábio Rodrigo Vicente Tavares, a escolha do nome é um ato político de reafricanização e resistência à colonização (entenda mais abaixo).

De acordo com Fábio, a tentativa de registro foi feita dois dias depois do nascimento da criança, no Hospital Sofia Feldman, que possui uma extensão do Cartório de Venda Nova, em BH. No local, o nome foi recusado sob a alegação de que Mboup seria um sobrenome, e não um segundo nome composto.

Após a negativa, Fábio seguiu a orientação da atendente e procurou outro cartório, no Terceiro Subdistrito, no Centro da capital mineira. Ele entrou com uma solicitação judicial para autorização do registro e aguarda resposta até o dia 2 de outubro.

O g1 entrou em contato com o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mas até a última atualização desta reportagem não havia obtido resposta.

“A gente precisa da certidão para acessar serviços básicos. Sem ela, não conseguimos licença paternidade, licença maternidade, nem atendimento no posto de saúde”, disse.

A escolha e o significado do nome

Para Fábio, o nome escolhido por ele e pela companheira carrega significados profundos ligados à ancestralidade africana e à resistência contra a colonização.

O casal vive no Brasil e considera o nome uma forma de preservar a origem e a identidade da criança desde o nascimento.

“O processo de colonização começa tirando o nome da pessoa, para que ela perca sua origem e identidade. Então, dar um nome africano é o primeiro passo para reafricanizar”, afirma o pai.

Tumi, nome escolhido pela mãe, representa lealdade. Mboup, proposto pelo pai, é um sobrenome comum no Senegal. De acordo com ele, é uma homenagem ao intelectual senegalês Cheikh Anta Diop, autor de A Unidade Cultural África Negra.

Sociólogo, Fábio reforça que Mboup, sobrenome comum entre falantes do idioma africano wolof, é usado em mais de 30 países. Para o casal, o nome é também uma forma de "localização mental".

"Queremos que, ao olhar para nós, Tumi Mboup saiba que nossa origem é África. E não falo de uma questão meramente afetiva. O nome é uma questão política, tanto para mim quanto para Kelly, que é uma historiadora e que que estuda as questões raciais. Então, não tem como a gente, nesta altura do campeonato, aceitar o processo colonizador. Aí não dá", desabafou.

Fonte: G1