Bebê de 1 ano morre após atendimento negado e família pede exumação

Foto: Cedida pela família

A família de Aylla Eloá, uma bebê de um ano e dois meses de idade, entrou com um pedido na Justiça solicitando uma exumação no corpo dela.

A criança faleceu na noite de 4 de julho, uma sexta-feira, após ter atendimento negado em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) em Jaguariaíva, nos Campos Gerais do Paraná.

Na época, o prefeito do município, Juca Sloboda (PL), admitiu que houve falhas no atendimento e disse que iria revisar os procedimentos da Secretaria Municipal de Saúde. 

Relembre o que a prefeitura disse, na época da morte

Os pais contam que a menina teve febre durante a madrugada, melhorou, e voltou a apresentar sintomas febris durante a tarde. A mãe conta que foi até uma Unidade Básica de Saúde (UBS), teve atendimento negado, e depois foi a pé para um hospital. No caminho, Aylla sofreu convulsões. Horas depois, ela morreu durante atendimento médico. Relembre detalhes mais abaixo.

No atestado de óbito, consta que a menina morreu por insuficiência respiratória aguda, pneumonia comunitária e broncoespasmo grave/crise asmática.

No entanto, a família questiona a causa da morte que foi registrada oficialmente. A advogada Sylmara Fraga, que representa os pais da menina, afirma que a criança nunca havia sido diagnosticada ou tido quaisquer sintomas relativos às doenças.

"Aylla nunca foi internada, nem tinha qualquer problema de saúde. A família tem informações que uma suposta tentativa de intubação teria sido a causa da morte, por isso está requerendo a exumação do corpo", explica a advogada.

Pedido de exumação

A situação foi investigada pela Polícia Civil. A advogada afirma que primeiro ela e os pais da criança pediram ao delegado para que ele fizesse a solicitação do exame. No entanto, como ele não fez, entraram com um processo na Justiça fazendo o pedido.

A advogada explica que o processo foi aberto no dia 1º de setembro e, no dia seguinte, o pedido de exumação foi negado. Agora, a defesa vai recorrer da decisão.

Também no dia 1º de setembro a Polícia Civil oficializou o fim das investigações e decidiu arquivar o inquérito. No relatório final, o delegado João Batista da Silva Júnior afirma ser desnecessária a exumação do corpo da bebê, "considerando que os elementos clínicos e periciais já eram suficientes para a elucidação do caso".

Entre os elementos usados pelo policial, estão a informação de que, antes da intubação, Ayla foi submetida a uma radiografia que apontou uma "consolidação em ápice de pulmão", ou seja, uma mancha que aponta que o ar foi substituído por pus, sangue, ou outros indícios que revelam doença respiratórias.

No relatório, ele também ressalta que a Polícia Científica do Paraná analisou os prontuários médicos da bebê e concluiu que a morte foi compatível com síndrome respiratória aguda grave.

"É importante destacar que o prontuário médico indica que ela nasceu em 15/04/2024, prematura, com 34 semanas e 3 dias, pesando 1.850g, apresentando-se hipoativa, hiporreativa e hipocorada. Ainda consta que, ao dar entrada na unidade neonatal, a criança exibiu quadro de gemência e esforço respiratório, entre outras observações clínicas relevantes. [...] Os elementos colhidos são suficientes para concluir que a morte da vítima decorreu de complicações clínicas de natureza respiratórias, restando caracterizada a ocorrência de uma fatalidade de origem clínica, sem qualquer indício de conduta delituosa imputável a terceiros", escreveu o delegado.

Márcio Jesus, pai da bebê, procurou o g1 e disse que a família só conseguiria sair da dúvida com a exumação do corpo.

"A gente pediu, não foi feita a autópsia dela. A gente pediu a exumação, porém foi confirmado que o delegado concluiu que não precisava e deu o caso como encerrado. Como que ele vai encerrar o caso se não foi feita a exumação, a autópsia da menina pra gente saber realmente porque ela morreu? O porquê eu sei: foi negligência", diz o pai.

Atendimento negado

Em relação ao atendimento ter sido negado no posto de saúde, a polícia descobriu que quem estava na recepção da UBS no momento em que a mãe e a criança foram até o local era uma agente comunitária de saúde, que estava cobrindo o intervalo da recepcionista.

"Ela informou que havia sido orientada de que não havia mais fichas e que, no horário das 16h às 17h, não havia médico na unidade. Relatou, ainda, que, ao atender a genitora da vítima, limitou-se a informar que não havia mais fichas disponíveis, orientando-a a procurar o hospital, não tendo sido questionada nem solicitado que aferisse a temperatura da infante", escreveu o delegado, no relatório do inquérito.

De acordo com ele, a coordenação municipal de atenção primária informou que, pelo procedimento operacional padrão, toda recepção de unidade de saúde deve realizar o acolhimento de pacientes que chegam sem ter atendimento agendado, mas que no caso de Ayla "o acolhimento não ocorreu corretamente devido à agente de saúde não ter passado por treinamento como as outras recepcionistas são treinadas".

"No dia do ocorrido havia um recepcionista em férias, uma de atestado médico, e no horário do ocorrido uma terminou o seu horário de expediente às 16h e se ausentou da unidade, e a recepcionista que permaneceria até as 21h, saiu para o seu horário de intervalo às 15h30 e retornaria às 16h30, ficando então na recepção por meia hora uma agente de saúde. Como ocorre todos os dias, as fichas para atendimento médico são retiradas pela manhã, na hora em que abre a unidade de saúde, cada médico que atende tem uma quantidade limitada de atendimentos que realiza por período, sendo assim no horário em que a mãe procura atendimento médico para a filha (16h16), já não havia mais a ficha para consulta em demanda espontânea. Se o caso da criança se enquadrasse em uma emergência, poderia ser agendado para a consulta com o médico", disse a coordenação.

O delegado lembrou que a criança chegou apenas com febre na unidade de saúde e sofreu as convulsões depois de sair dela, e disse que "não vislumbra conduta criminosa por parte da agente comunitária de saúde".

"Ela não possuía formação para ocupar o posto de recepcionista (conforme informação da enfermeira coordenadora da APS) e tampouco recusou deliberadamente atendimento a pessoa em risco iminente de vida, considerando que, naquele momento, a genitora apenas relatara quadro febril da infante", escreveu o policial.

O que a família alega

A irmã da bebê Quézia Vitória, relata que a família procurou a UBS quando a bebê estava com um quadro de febre.

Segundo Quézia, além de terem o atendimento negado, os familiares não receberam orientações nem outro tipo de suporte, como medição de febre, triagem ou encaminhamento de uma ambulância, por exemplo.

"Disseram que lá não podia ser feito nada."

A família, então, a levou para o hospital municipal, e no caminho a criança sofreu convulsões. Horas depois, ela morreu durante atendimento médico.

A morte, segundo a família

Ao g1, a irmã de Aylla disse que no dia em que faleceu, a criança acordou bem, passou a manhã brincando e após o almoço teve febre. Segundo ela, por volta das 16h, Aylla foi levada à UBS. Depois de ter o atendimento negado, foi para o hospital, onde chegou às 16h46.

"O hospital acionou o Samu às 19h39. O Samu chegou às 22h, e nesse tempo ela continuava convulsiva. Tentaram intubar, pois o Samu só leva se estiver intubada. A saturação dela estava entre 96%, 98%, e em alguns momentos 100%. Teve parada cardíaca, e o óbito foi às 23h18", afirmou.

Quézia fez uma publicação nas redes sociais lamentando sobre o caso e criticando, também, o atendimento hospitalar, serviço mantido pelo município.

Ela alega que, depois de dar entrada na instituição, a bebê ficou sete horas na instituição para um caso que, na avaliação dela, necessitava de transferência.

"Essa era a minha irmã, Aylla. Ela tinha 1 ano e 2 meses. Era saudável, cheia de vida, sorridente… uma bebê linda, agitada, feliz [...] Ela precisava de atendimento de um profissional que se importasse em salvar vidas, ela precisava de cuidado. Eu não consigo explicar essa dor."

Fonte: G1